Velho Joca - O curioso

    Velho Joca vive em busca de explicação para todas as coisas. Nem os oitenta e sete anos de idade conseguiram lhe tirar a curiosidade. É um cidadão sedento por informação. Aos que se surpreendem com a sua sabedoria ele costuma dizer:
     - Os anciãos não são mais inteligentes do que as demais pessoas. Só têm mais tempo de vivência... De aprendizado... De experiência...
   A simplicidade é uma das características do Velho Joca. Quando todo mundo fala ele prefere ficar calado. Em ambientes de grande movimentação de pessoas ele costuma se colocar em um canto, quieto, só observando os acontecimentos...
    - Às vezes eu me pergunto se tudo isso existe mesmo... De onde viemos? Para onde vamos? Por que tudo isso? Será que Deus estava se sentindo entediado quando resolveu permitir a povoação do universo e, junto com isso, tantos encontros? Tantos desencontros?
     Percebe-se que o Velho Joca tem permanentes conflitos de raciocínio. Ele não entende, por exemplo, as razões de se trabalhar muito por progresso já que, se as nações poderosas resolvem, cidades inteiras são destruídas em pouquíssimo tempo. Populações inteiras são dizimadas sem chance de socorro...
     - Eu vi o presidente de um país ser enforcado... A televisão mostrou tudo em tempo real... Só faltou colocar os gemidos do cara para todo mundo ouvir... Isto depois de o país dele passar por inacreditável massacre... Quantos anos eles precisarão para colocar o país deles no patamar de progresso que tinham antes da guerra?
     A mania de viver fazendo perguntas desse gênero é coisa que ninguém tira do Velho Joca. Agora ele está empenhado na busca de explicação para a famosa operação Lava Jato...
    - Não entendo mesmo... Lembro-me de que determinados políticos - alguns enfeitados por barbas não bem aparadas - conseguiram enorme destaque, nacional e internacional, a partir do início deste século. Propagandearam, pelo mundo todo, realizações como: uso racional dos recursos públicos, seriedade administrativa, redução da pobreza, fome zero, habitação para todos, inexistência de inflação, salários justos, vales de diferentes espécies, bolsas... Enfim: iludimo-nos até com um tal de Pré-Sal - sobre o qual hoje ninguém fala.
    Pois é... O Velho Joca faz uma tragada no seu inconfundível palheiro (enorme cigarro de palha) e dá prosseguimento às indagações. Insiste em recordar que, em âmbito nacional, fizeram, inclusive, uma alentadora propaganda de que 'o Brasil havia pago a sua histórica dívida externa' - tema que, a partir de escândalos levantados pela Lava Jato, não ousam mais abordar. E fica o Velho Joca fazendo as suas cogitações...
     - Eu acho que eles confundiram pagamento da dívida externa com distribuição de bilhões entre os que comungassem com as vergonhas internas. Com as roubalheiras internas. Tem um vizinho meu que, por engano de um banco, foi negativado no Serasa, no SPC e até na fruteira da esquina. E saiba que o engano da dita instituição financeira era de R$ 42,00. Um pequeno lapso, como disseram os sérios atendentes do banco, mesmo já passados cinco meses da data em que o cliente havia fechado a sua conta. 
    É... O Velho Joca não assimila essas coisas. Acha que é incorreto negativar, por engano, o crédito do cidadão enquanto a ladroagem dos políticos não é punida. Enquanto o país é massacrado por uma crise sem precedente. "Mas quem - da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou das Assembleias Legislativas - se dispõe a liderar movimento que efetivamente defenda o cidadão de bem??? Aquele que produz e recolhe tributos para o sustento da nação... Quem o defende de verdade???" Estas são insistentes perguntas do Velho Joca.  
      Dona Nenê, mulher do Velho Joca, vai para a cozinha desanimada. Ela acha que o Velho Joca não devia se envolver em certas coisas. Podia ficar assistindo a novela e deixar as questões políticas e sociais para quem tem influência. O Velho Joca, porém, é extremamente teimoso...
     - Sou do tempo dos homens honrados... Homens e mulheres de décadas passadas eram extremamente responsáveis em seus atos. Acho que a situação, em anos recentes, se reverteu. Hoje ganha voto e aplauso quem promete e não cumpre. Quem não dá a menor importância à palavra empenhada. Quem conquista cargo eletivo para colocar, no já gigantesco acervo de leis, umas a mais que lhe assegurem aumentos de remuneração e, é claro, também bom padrão de ganho para os seus cabos eleitorais. Aliás: seus assessores. É... Aqueles bobos-da-corte que a gente encontra pelas esquinas, dia e noite, oferecendo apertos de mão.
     O Velho Joca foge destes apertos de mão. Gosta de dar "adeus" (assim ele classifica o aperto de mão) só para pessoas próximas ou, pelo menos, que estejam despidas de interesses não revelados. E tem mais... Sabe o Velho Joca que aperto de mão, nos dias de hoje, exige uma proximidade com álcool em gel para se evitar as gripes e um universo de outras doenças difíceis de serem curadas. Apesar de que, na opinião dele, difícil de curar mesmo é a falta de vergonha que se disseminou por todo o cenário político nacional. 
       - Eu gostaria que Lava Jato fosse remédio vendido em farmácia. Daí a gente fazia uma vaquinha e, sem muito acanhamento, colocava o produto goela abaixo de toda essa gente. (Autor: Francisco de Campos - Todos os direitos reservados/Lei dos Direitos Autorais Nº 9610/98)

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