Acho que exagerei

    Em um determinado momento passei a fazer uma análise atenciosa e constante sobre a forma como meu primeiro filho se comportava em relação aos estudos. Precisava saber se ele estava acatando aquilo que eu havia absorvido como certo ao longo de ensinamentos paternos extremamente severos.
    O garoto recém chegava da escola e lá estava eu verificando caligrafia, cumprimento de tarefas, nível de aprendizagem... Enfim: eu decidira sargentear os procedimentos daquele ser em seus primeiros passos na vida das lições oficiais. Acho que este é um erro de todo pai estreante. 
    Para minha surpresa tudo costumava estar perfeito. O menino era zeloso nos mais diferentes aspectos. Matemática, linguagem, ciências, geografia, história... No boletim a nota mínima era 8,5. Só que eu, movido pela rigidez de criação, certa vez enxerguei "orelhas de burro" (dobragens em um conjunto de folhas por manuseio dentro e fora da pasta) no seu caderno de matemática e isso me deu autoridade para drásticas observações. 
    As faces rosadas do menino que acabara de chegar em casa trocaram de cor. Firmou-se em seu rosto a cor apática dos decepcionados. Sim. Meu filho esperava elogios e eu acabei notando o único erro que cometera. Aliás... Nem era um erro. "Orelha de burro" a gente vê até em um bloco de receitas médicas.
    MUNDO REAL
    Não fui contestado na minha negativa observação. Porém: também não mereci aplausos. Aquele ser inocente estava sendo levado por uma natureza que não lhe permitia se conscientizar de tal nível de severidade. É isso mesmo... Meu filho, de sete anos, não sabia que o mundo era feito de pessoas obrigadas a pisar em ovos. Ele pensava ser o universo - e a Terra em consequência - um lugar para se experimentar as sensações do paraíso. 
    Nada ele disse para corrigir as minhas reclamações. Ficou no mais absoluto silêncio. Mas, nesse silêncio, me transmitiu uma mensagem... "Meu pai... Eu estou empenhado numa caminhada inteiramente correta. Lamento lhe dar esta decepção. Prometo-lhe que isto não vai se repetir."
    Pois é... Com esse posicionamento afável o garoto me colocou em horas de meditação. Longas horas de análise sobre o certo e o errado. E no final... Sim... E no final o que eu conclui? Preciso lhe confessar: no final eu conclui que estava querendo produzir um ser humano acima do perfeito para este mundo que, todos sabemos, é muito imperfeito.
     Oficializado esse raciocínio meditei sobre pessoas que buscaram incansavelmente a perfeição. Martin Luther King, John Lennon, Mahatma Gandhi, John Kennedy, Madre Tereza de Calcutá... Você sabe que existem muitos outros garimpeiros da perfeição. Praticantes da máxima perfeição. Todos eles, entretanto, jazem na iminência do esquecimento. São lembrados hoje? Mas fique certo que serão esquecidos em breve futuro. 
    CONCLUSÃO
     Meu filho querido dos primeiros anos de escola... Você era perfeito... Você é perfeito... Você é aquilo que a nossa pátria ainda não sabe valorizar. Tem a minha admiração - com as "orelhas de burro" tão lógicas no caderno de qualquer estudante. Beijo com o carinho que você sabe existir. 
    Mensagem de frei Wilson Sperandio/Marau 2001: "Lutemos contra esta escola que prende nossos filhos em quatro paredes para impedi-los de pensar." (Autor: Francisco de Campos - Todos os direitos reservados/Lei dos Direitos Autorais Nº 9610/98)
   

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